Caxola

Idéias flutuam pela ruas da cidade. Nadam pelos ares em busca de ouvidos atentos e ansiosas por olhos curiosos. Meu prazer voluntário é capturá-las, vesti-las de sedas e traduzi-las em palavras. No Caxola, a beleza acre do cotidiano veste traje de gala.

quarta-feira, março 08, 2006

Oito de março. Dia de quê?

Depois de meses sem receber flores, ganhei, hoje, uma rosa. Não foi presente de nenhum apaixonado, nem mesmo de um amigo. Foi de um garoto de mais ou menos 20 anos, sentado atrás de uma esteira rolante, vestindo um uniforme verde listrado e com o cabelo emplastado de gel. Depois de registrar um pacote de pão de sanduíche, 250g de queijo mussarela, uma caixa de lenços de papel, 700g de tomate e uma lata de leite condensado, o garoto estendeu uma mão para receber o pagamento pelas compras e a outra para oferecer-me a rosa: “Obrigado pela preferência, senhora, e parabéns pelo seu dia!”.

Saí do supermercado com uma sacola em cada mão e com a rosa debaixo do braço. Um dia só meu. Um dia, dos 365 outros, dedicado aos seres humanos de salto alto e saia rodada. Segui caminhando até minha casa. Corações vermelhos decoram as lojas, fotos de mulheres-deusas colorem os outdoors. Em todos os anúncios, mulheres à venda, afinal nesse dia, somos artigo de luxo. Mas sabe de uma coisa? Não quero flores, roupa, perfume ou maquiagem. Quero martelo, computador, estetoscópio e mala de ferramentas.

O dia da mulher surgiu dentro de partidos socialistas russos, europeus e americanos, onde as operárias tinham um dia do mês para discutirem questões como a miséria, o voto e a guerra. O Oito de Março nasce, na verdade, de inúmeras lutas das mulher de esquerda, em várias datas. Fina ironia a comercialização desse dia, feito para marcar a presença da mulher trabalhadora e contrária às forças do capitalismo. Já que todos os holofotes estão sob nós, vamos aproveitar a oportunidade e berrar por mais vergonha na cara e menos demagogia.

Por mulheres e por homens.
Texto publicado em 09 de março de 2004

3 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Eu tb ganhei uma rosa no comércio ontem e registrei lá no BN como me senti: uma palhaça. Detesto 8/3.

09 março, 2006 12:02  
Anonymous Anônimo said...

Muito bom, como sempre!
Tb penso assim.
Beijos SF.

14 março, 2006 10:58  
Anonymous Anônimo said...

Carol,
Verdade, somente os oprimidos tem um dia só para si.
Pena que ainda existam mulheres, infelizmente, que servem de "massa de manobra".
Acredito na nova geração de mulheres, que encherga longe a malandragem da mídia!
Deviamos ser homenageadas todos os dias, porque ser mulher não é facil!
Bjo Pity com amor

21 março, 2006 20:44  

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